quarta-feira, 22 de junho de 2016





O Sonho Perdido


Um homem velejava em seu barquinho pelo oceano. Aquele era mais um dia em muitos anos onde procurava uma Ilha de tesouros. Já havia parado em várias ilhas, mas em nenhuma delas descobrira qualquer riqueza. 
Em suas buscas passara por grandes aventuras, como fugir de animais selvagens e sobreviver a correntezas gigantes.
Uma noite, avistou uma figura bem estranha nadando na superfície do mar. Era metade peixe e metade mulher. Demorou alguns minutos até que percebesse que se tratava de uma sereia.
-Sereia? 
-Sim. - respondeu a coisa. 
Aquilo não era para ser um diálogo. "Foi apenas um alto pensamento. "-refletiu o homem. Deveria ser fruto de sua imaginação. "E não deveria conversar com ela". 
Ilusão ou não sentiu que deveria dizer algo quando ela se aproximou sacudindo as barbatanas. 
A meio mulher olhou-o fixamente em seus olhos com um ar de súplica. E elevando uma das mãos chamou-o pelo nome.
Então o homem arriscou:
-O que queres ? 
-Siga-me e te mostrarei. 
O homem pegou seus remos e começou a remar. 
Mas ela virou-se e disse:
-Não é assim. Deves nadar comigo por dentro do mar. 
-Mas eu não sei... 
Antes que terminasse sua frase, a sereia tocou uma de suas mãos. Imediatamente ele sentiu que faltava-lhe completamente o ar.
Então ela disse:
- Já podes respirar dentro da água. 
Com o desespero da luta pela vida, o homem mergulhou no mar profundo e sentiu seus pulmões inflando aliviados.
Agora que viu do que a sereia era capaz o homem decidiu segui-la. Havia um misto de curiosidade e agitação dentro dele. O que estava prestes a descobrir? Será que conheceria outros seres iguais aquela que o guiava? Tentou esquivar-se de seus pensamentos porque alguns deles causavam-lhe o medo da morte. 
Enquanto nadavam, o caminho pareceu-lhe eterno. Haviam tantas perguntas em sua mente. Desejou afugenta -las,até que percebeu que também poderia falar. Então dirigindo -se a mulher-peixe disse: 
-Quem é você e por que estamos nadando? 
-Agora fizestes a pergunta correta. Sou uma sereia habitante do mar abissal de Anísio. Vivemos há centenas de anos e... 
Mas ela interrompeu a fala expulsando um tubarão que rondava-os com um simples estalar de dedos.
O homem ficou ainda mais impressionado e retomou a palavra:
-Como você consegue fazer isso? Você tem poderes mágicos?
-Na verdade não exatamente. 
-Como fez isso então? Insistiu o homem. 
-Uma sereia se alimenta de sonhos. 
-Ainda não entendi. 
-Eu sou a sua sereia protetora. Cada humano tem uma. 
Havia agora uma grande exclamação no olhar do humano que perguntou:
- Eu tenho uma... se-reia pro-te-tora? 
-Sim. Eu vi seu sonho e estou aqui para realizá-lo.
Dito isto a sereia rodopiou em círculo fazendo vários peixinhos se dispersarem. -Venha-disse ela-estamos quase lá. 
O homem agora tinha um sorriso cor de rosa sob olhos prateados de esperança. 
Depois de seguirem por mais dez metros marinhos, pararam em frente a uma concha gigante. 
-Pronto. Aqui estamos. Abra. -Disse a sereia sorridente. 
O homem então retirou a tampa da concha e teve uma grande surpresa. Ela estava completamente vazia. 
-Mas esse não é meu sonho. - Disse ele-Aqui não deveria ter muitas jóias? Era com isso que eu estava sonhando.
-Exatamente-respondeu a sereia. 
Mas o homem agora estava impaciente e disse:
- Ah não sei porque estou perdendo meu tempo com você. Vou embora. 
-Espere, espere-pediu ela com insistência . Mas de nada adiantou. 
O homem estava determinado a voltar. Então ele nadou, nadou, até que chegou a superfície. E voltou a ser apenas um homem com pulmões normais. 
Retornou a sua antiga casa, onde havia deixado para perseguir suas aventuras oceânicas.
Em sua primeira noite em terra firme dormiu e sonhou. Nele sua sereia o visitou e disse-lhe:
- Ah, meu querido, quantas vezes quis te mostrar? Mas agora é tarde demais. Teu sonho está desfeito!
-Mas como isso aconteceu? Perguntou o homem com um tom de desgosto.
-Aquela concha era o portal para a maior Ilha de tesouros que jamais existiu. Olhe! 
Logo, ele avistou uma linda ilha com o tom dourado e iluminado. Havia nela centenas de ouro, diamantes e todos os tipos de pedras preciosas. 
Agora os lábios do homem tremiam como uma folha de papel sob o vento forte. 
Então a sereia continuou:
-Não posso mais existir porque não há mais sonhos em tua mente. 
E desapareceu como o sol perante o crepúsculo. 
Assim, o homem acordou e chorou.  Agora estava determinado a viver a maior aventura de todas,aquela que seria travada em seu próprio eu: o resgate de seu sonho perdido.

quarta-feira, 15 de junho de 2016




A Fera da Floresta

Havia um casal que morava numa floresta.
Numa noite, a mulher, que estava grávida e sozinha em casa porque o marido fora trabalhar, começou a passar mal. Deitou-se na cama e percebeu que havia chegado a hora: Seu bebê estava nascendo.
Quando o marido retornou, tamanha foi sua surpresa e tristeza quando viu o filhinho ao lado da mãe, chorando. A mulher não resistira ao parto.
O homem, por sua vez também não suportou a dor da perda da esposa  e enlouqueceu. Foi embora, abandonando o menino.
Logo, uma grande onça pintada entrou na casa e olhou para o bebê. Num instante pareceu que seus olhos brilharam. Foi então que começou a cuidar dele como sua própria cria. A criança foi crescendo, acreditando fazer parte da floresta. E para assemelhar-se mais aos animais, cobria-se com seus pêlos e pintava-se.
Um dia, quando já estava com dezesseis anos, o rapaz estava caminhando pela mata e avistou um grupo de jovens acampando. Com o instinto de um animal quadrúpede, correu até eles e rosnou.
Logo, muitos riram e fizeram chacota do rapaz. Mas uma bela moça, que não participou das gozações, aproximou-se dele, que parecia agora muito confuso e ao tocar sua mão disse:
-Não fique com medo. Viemos em paz. Não ligue para meus amigos. Eles não sabem brincar às vezes, mas são boas pessoas.
O singular jovem apenas esquivou-se, mergulhando entre as árvores.
Aquele acampamento durou três meses e por esse tempo, muitos animais ferozes tentaram aproximar-se, mas toda vez o rapaz da floresta os expulsava.
A moça que falara com ele ficou muito encantada com sua capacidade de controlar os animais e proteger as pessoas.
E no dia que estava encerrando o acampamento, ela queria que o rapaz voltasse com eles. De alguma forma aquele estranho havia tocado suas emoções mais profundas.
Todos concordaram em procurá-lo, mas como não o encontraram em parte alguma, decidiram ir embora. Mas a moça não quis voltar com eles.
-Continuarei procurando.Vão sem mim. Ele precisa viver como a gente.
Então, mesmo contrariados, os amigos foram embora deixando a garota sozinha em sua busca.
Ela caminhou, caminhou e se deparou com uma grade onça, a mesma que criara o garoto. O animal mirou-a, correndo em sua direção, mas o jovem saindo de trás de arbusto rosnou como se falasse a língua das feras. Nesse momento a assustadora onça pareceu um gatinho assustado, aproximou-se do garoto, que acariciou-lhe a cabeça. Agora ambos rosnavam como se estivessem num diálogo notoriamente sensível.
O mamífero abaixou a cabeçorra e, como uma magnífica reverência, foi embora, desaparecendo por trás de uma montanha arborizada.
A lua estava linda. A floresta parecia tocar uma canção romântica.E os dois jovens se aproximaram.
Não sabiam se comunicar com palavras, mas eram humanos e a natureza os dotara da língua do coração. E foi a essa que recorreram quando suas mãos se cruzaram.
Em breve ele conheceria um outro mundo, mas sabiam que nada poderia fazê-los esquecer de como aprenderam a amar.





































quinta-feira, 9 de junho de 2016



A Floresta de Tulio

Tulio subiu as escadas e entrou em seu quarto. Uma grande onça pintada o mirou sobre o tapete Persa.
Acionou a maçaneta para fugir sem pensar o que havia trazido aquele animal até ali.
Foi então que cada peça do seu dormitório ganhou formas de árvores ou animais. O tapete tornou-se em grama e o assoalho em terra.
O teto havia sumido e o céu estava muito escuro e estrelado para as três horas da tarde registradas em seu relógio.
Mas o que estava acontecendo? Ao redor misturou-se mato, terra, animais caçadores e sua próxima presa:ele, um jovem de vinte anos.
De repente sua visão rodou com uma velocidade nauseante e, repentinamente, como se alguém estivesse desligado o liquidificador, tudo parou.
Todo o cenário agora era o mesmo, mas os animais não o olhavam de maneira ameaçadora e ele estava prostrado de quatro e rosnando.
O que estava acontecendo? Quem era ele? Por que se sentia tão estranho?
Então, uma bela onça branca aproximando-se o cheirou.
Foi então que tomou consciência de sua nova forma:uma onça macho alfa.
Mas como aquilo acontecera? Que fenômenos eram aqueles?
Uma veia palpitou de seu pescoço revelando seu nervosismo.
E a onça branca falou:
-Vamos
Tantas perguntas percorreram sua mente que ele nem soube por onde começar a perguntar para aquela que se comunicava com ele.
E começou a andar ao lado da companheira. Não sabia para onde ia, mas a caminhada o ajudava a pensar.
De repente parou e decidiu perguntar.
-Espere, para onde estamos indo?
-Achei que você soubesse-respondeu a onça fêmea.
Essa resposta foi suficiente para ele entender o que estava acontecendo.
-Sim, vamos-respondeu resoluto.

A onça fêmea então voltou para a caixa de brinquedos e a onça macho voltou a ser um menino para descer à sala de jantar. 

terça-feira, 7 de junho de 2016



A nuvem e a chuva


Havia um rio chamado Prosperidade, que era o abrigo de diversos tipos de peixes.
Num certo verão, o calor levou para o céu muitas gotículas de água do rio. E elas logo formaram nuvens carregadas diversas.
Embora as nuvens estivessem deslizando-se formando manchas escuras na atmosfera, elas recusavam-se a precipitar-se, pois estavam esperando as ordens da natureza.
Foi então que o rio começou a secar, mas os peixes nem perceberam. A vida parecia boa demais para se preocuparem com qualquer coisa.
Assim foi nos dias seguintes, por cinco longos meses até que o rio ficou muito raso.
Então, finalmente a gravidade autorizou e muitas gotas foram cumprir seu papel, caindo com muita força em muitos lugares.
Mas uma das nuvens não ouviu o aviso porque estava dormindo. Afinal o sinal para a chuva estava demorando tanto que achou que poderia descansar um pouco.
Acontece que aquela era a nuvem que tinha sido designada para regar o Prosperidade. E,como não rompeu no tempo certo, foi levada para outro lugar.
Então o rio secou e morreu, juntamente com todos os peixes que nele habitavam.
E a nuvem ficou tão triste, mas tão triste que chorou copiosamente. E onde suas gotas caíram formou-se um grande mar intitulado até hoje de Lamentações.





sexta-feira, 3 de junho de 2016



Aliança de ouro

Era uma vez um homem sábio que estava muito doente. Sua única família era seu pequeno filho de nove anos, Estêvão.
Antes de morrer, o sábio mandou chamar o filho ao seu leito e entregou-lhe uma aliança de ouro.
-Tome, meu filho. Este anel não é comum. Pertenceu a nossos ancestrais  e quero que fiques com ele.Quando tiveres vinte anos, poderás acessar seus poderes. Aponte-o para a constelação de Fornax e irás ao Mundo do Ouro. Lá, encontrarás muita riqueza. Mas lembre-se que a melhor escolha definirá tua maior riqueza.
Assim, o menino foi crescendo e quando completou vinte anos, decidiu testar o poder do anel. Seguindo as orientações do pai, começou a ir diariamente ao Mundo do Ouro até se tornar o homem mais rico do mundo.
Adquirira muitas mansões, carros e tudo o que o dinheiro podia comprar. Parecia nunca estar satisfeito, acumulando cada vez mais fortunas e bens materiais.
Mas Estêvão não estava disposto a compartilhar seu segredo.Temia que se mais alguém soubesse, pudesse tomar sua aliança.
Um dia, ele conheceu Aurora, uma moça que fez seu coração disparar intensamente. Mas ela não retribuía suas investidas.
O jovem, contudo, não queria desistir. Tentou conquistá-la de todas as formas que pôde. Presenteou-a com caras jóias, carros, convites a passeios e lugares incríveis e os vestidos mais lindos.Mas nada disso convenceu-a. 
Por isso, ele começou a ficar muito triste.
-Eu posso comprar qualquer coisa, menos o amor de Aurora. -Lamentava-se.
Então, mesmo cansado, decidiu tentar mais uma vez.
Foi até a casa da moça e , ajoelhando-se a sua frente disse:
-Minha linda donzela, até hoje acreditei que tinha tudo, mas hoje sem ti, me sinto miserável. Sou capaz de renunciar a todo meu ouro se aceitares ser minha esposa.
E a jovem respondeu:
-Sim, eu aceito.
-Como?-Perguntou Estêvão imaginando que não tivesse entendido.
-Sim, eu também te amo! Nunca confessei-me porque desejava que teu coração estivesse nas coisas que mais importam, relacionadas ao amor. E agora vejo que estás mudado. Por isso eu...
Mas a moça não pôde completar a frase porque Estêvão a beijou.
E retirando sua aliança, colocou no dedo da moça prosseguindo seu discurso:
- Como prova de meu amor...
Foi então que sua fala foi interrompida com uma forte vibração em forma de ondas douradas que se espalhavam em cada canto da casa.
E antes que pudesse entender, notou que os raios haviam dominado tudo. Ele não precisaria mais viajar. Seu próprio mundo agora era o Mundo do Ouro. Todos seriam ricos.
Mas agora sim ele se considerava o mais rico de todos, pois tinha o amor de Aurora.

quarta-feira, 1 de junho de 2016







O último oxigênio


Celine era uma mulher de meia idade que morava sozinha numa linda casa no campo. Ela não se casara porque nunca se esqueceu de seu grande amor:Rodolfo, seu melhor amigo da juventude.
Uma noite, quando já estava pegando no sono, percebeu uma luz na varanda. 
"Que estranho"-Pensou. "Eu tinha certeza que já havia apagado todas as luzes da casa".
Até que de repente a porta da sala bateu com forças. Ela desceu as escadas. Mas pela janela não viu ninguém.
"Pode ter sido o vento" Tranquilizou-se ao voltar para seu quarto.
Foi então que as batidas na porta aumentaram, assim como a intensidade da claridade, que ampliava-se agora por cada cômodo da casa, como se alguém estivesse acendendo todas as luzes sucessivamente.
Teve tanto medo que escondeu-se por debaixo das cobertas.Até que ouviu uma voz chamá-la:
-Celine, sou eu.
Conhecia bem essa voz. Era exatamente igual a de quem ainda estava tão presente dentro dela. E teve uma sensação que não tinha a muito tempo, desde que seu amado a rejeitara. 
-Rodolfo?- Disse assustada a mulher ao tirar do rosto uma manta quente de lã.
-Sim, sou eu. E vim buscá-la. A Terra será destruída hoje a noite e sou um dos escolhidos para salvar os preparados.
-Os preparados?
-Sim, os justos- disse o homem.
-Mas e sua esposa? E seus filhos?
-Eu não formei uma família ainda.
-Sério?Perdemos tanto contato que eu nunca soube.
-Sim, e precisamos ser rápidos.
-E para onde nós vamos?
-Para um abrigo. Esse mundo sofrerá por dois dias um ataque semelhante a de bombas atômicas que sugarão todo o oxigênio e vida existente.
Assim, o homem pegou a mulher pelo braço e a levou para dentro de uma espécie de caixa de pedras fechada.
-Aqui- Disse ele- estamos salvos.Há oxigênio suficiente para dois dias, mas minha missão era compartilhá-lo com alguém e escolhi você.
-Eu? Por que você me escolheu?Nós nem somos mais...
-Amigos?- O homem completou com uma pergunta.
-Sim- Respondeu a mulher.
-Mas a verdadeira amizade é eterna. Nunca te esqueci, Celine.
-Eu também não, Rodolfo.
-Senti sua falta de verdade por todo esse tempo e nunca tive coragem...
-Coragem?- Quis saber a mulher corando um pouco.
-Sim- Disse o homem apoiando suas mãos sobre as dela.
-Eu te amo, celine. E sempre te amei, não só como amigo. Me desculpe por...
Mas a frase não pôde ser completada porque a mulher beijou-o entre lágrimas.
Em seguida ela disse: 
-Agora eu sei que o amor é como o oxigênio. E obrigada por ter guardado ambos para mim.