sexta-feira, 22 de abril de 2016







Delta


Meia noite. Uma ou duas ondas atarracavam na Costa de Delta e Sulevan estava desolado. 
"Eles a levaram". Falava consigo mesmo, mas suas expressões eram dirigidas ao imenso mar que quase dormia. 
A distância um archote mal iluminado servia para trazer as lembranças de dias insólitos, mas tão reais quanto as batidas de seu coração. 
A lua estava clara e a maior que ele já vira. Dentro dela dois apaixonados davam as mãos e se declaravam:
-Se eu pudesse voltar o tempo... dizia uma bela jovem.
- Ah e não pode? Perguntou um rapaz de cabelos vermelhos.
-Talvez consigamos fazer isso juntos. 
-Deixe-me tentar- encerrou o diálogo com um doce beijo o rapaz.
Enquanto isso um pequeno bote vinha em sua direção. Nele, uma criatura. Nem mulher, nem fera, mas uma combinação de ambos. 
A expressão daquela coisa era vertiginosa, como se experimentasse um sofrimento amargoso e contido nos olhos cor de sangue. 
Seus cabelos tinham a cor do cinza chumbo, dando-lhe uma aparência pesada, como se tivesse saído do forno em brasas. 
Sem ao menos abrir a boca, a figura deu um grito sinistro. 
Pássaros assustados voaram para longe. Mas a criatura mirou o rapaz apontando-lhes seu dedo fino. Agora a face do jovem era de terror e medo. E o gelo do oceano parecia penetrar sua pele. 
Abraçou a lembrança de sua amada. 
De repente a mulher -fera apresentou-se:
-Sou eu, Esmeralda. 
-Esmeralda? 
-Sim, tua amada.Aquela aldeia que me levou é de um antigo bando que não acredita no amor. Se chamam "Sem coração", por isso me transformaram nisso , para que não ficássemos mais juntos E ficarei com essa aparência horrível para sempre a menos que...
-A menos que ? Quis saber o jovem.
-Você me leve de volta para o meu antigo mar.
-Como assim? 
-O mar, minha terra. 
Nessa aparência eu só posso viver na água. Este bote são minhas pernas. 
-O que quer dizer? 
-Eu não posso andar e nem nadar. Só esse bote pode me deslocar. E apenas um amor verdadeiro pode me salvar.
-Se fores de fato Esmeralda,saberás me responder...
-Concordo com a condição. Podes perguntar-me o que desejas.- Respondeu a coisa.
-O que eu vejo sempre na lua ?
-O dia em que te declarastes a mim, Esmeralda.
-Como sabes que vejo Esme...?- Perguntou o rapaz dando de ombros e contrariado. 
Mas a  figura não respondeu. Achou desnecessário. Apenas rodou o seu bote e mirou o rapaz, que fez outra pergunta:
-Mas como poderás voltar a ser. E foi de imediato interrompido.
-Esmeralda, o teu verdadeiro amor?
-Sim.
- Não é tão simples assim, só há uma forma. 
E o rapaz insistiu dessa vez se aproximando como que implorando.
-Se és mesmo Esmeralda, ambos desejamos isso mais que tudo. Diga-me, por favor.
-Eis a questão... será difícil convencer-te- Falou a criatura com desânimo, seus olhos voltados para o horizonte.
-E o que isso importa? O que temos a perder ?
-Está bem- Concordou a coisa ponderando-A minha salvação é o retorno do nosso amor. 
-Por favor, continue.
-A crença.Somente a crença verdadeira poderá me salvar. No momento em que me veres como a Esmeralda, eu voltarei a sê-la e ambos voltaremos a nossa terra. 
Semanas e meses se passaram. E com o tempo o rapaz foi se afeiçoando com aquela estranha figura como se de repente a aparência não importasse mais. Até que finalmente convenceu-se que ela só poderia ser sua amada. 
Assim, a jovem retomou sua antiga aparência e o sentimento entre aquele casal intensificou-se, pois eles haviam descoberto o significado mais profundo da palavra "amar".








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